“Não se preocupem com o que comer, beber ou vestir, mas
busquem em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça, e todas estas coisas
vos serão acrescentadas.”
Esta recomendação de
Jesus aos discípulos é geralmente interpretada como uma declaração de Deus prometendo
que os que cristãos fiéis jamais passarão fome, sede ou frio, isto é, terão
suas necessidades físicas e materiais absolutamente supridas. Mas parece que
não é só isso.
Não foram poucos os cristãos que ao longo da história
sofreram privações extremas, alguns deles justamente porque buscaram o reino de
Deus e sua justiça em primeiro lugar. Ainda hoje, temos à nossa volta centenas
de milhares de cristãos vivendo na pobreza, em condições desumanas. Muitos são
perseguidos e mortos por sua fidelidade a Jesus e ao reino de Deus. Será que
todos são infiéis? Será que Deus se esqueceu ou desistiu de cuidar deles? Há
algo errado com Deus, com os nossos irmãos, ou com a maneira como interpretamos
a promessa de Jesus? Prefiro a terceira hipótese.
Jesus quis dizer pelo menos três coisas com sua palavra a
respeito da primazia do reino de Deus. Primeiro, deixou claro que, caso viéssemos
a passar por privações, não faria sentido imaginarmos que Deus se esqueceu de
nós, pois se Ele cuida das flores e dos passarinhos, como deixaria de cuidar
dos seus filhos? A privação se explica por outro motivo que não o abandono ou
descuido de Deus. Em segundo lugar, Jesus quis deixar claro que os cristãos não
mais se preocupam com comida, bebida e roupas, mas com o reino de Deus. Na
verdade, Jesus disse que deveríamos escolher viver para o nosso reino ou o
reino de Deus.
Finalmente, Jesus quis dizer que Deus jamais sonegaria todas
as coisas necessárias para a sobrevivência dos seus filhos. Acontece que a
promessa não é para cada cristão individualmente, mas para os cristãos como
corpo, como família, como unidade espiritual, de modo que o não passar
privações depende da capacidade da comunidade dos discípulos repartir tudo
quanto já recebeu de Deus. O fato de um cristão passar por privação não diz
nada a respeito de Deus, mas tudo a respeito da comunidade cristã. Entre os
discípulos de Jesus “ninguém considera seu o que possui”, de modo que “quem
colhe demais não tem sobrando e quem colhe de menos não tem faltando”, e nesse
caso, quando um cristão passa fome, a comunidade está em débito.
A questão é a seguinte: quanto mais vivemos determinados
pelo conforto material, mais indiferentes seremos às necessidades dos outros.
Quanto mais vivemos para o reino de Deus e sua justiça, menos privações haverá
ao nosso redor. Resta saber como queremos viver: preocupados com comer, beber e
vestir, ou dedicados a promover a justiça do reino de Deus.
Ed Rene Kivitz
http://edrenekivitz.com/blog/2012/09/para-nao-dizer-nao-falei-das-flores/
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