“Como é ser discípulo de Jesus?”
— é a pergunta de muitos.
Por Caio Fábio
Ora, é simples e terrível; e é
tão terrível justamente porque é tão simples; e gera tanto esforço justamente
por isso, pois nada há tão difícil quanto a simplicidade, nem que demande mais
esforço que descansar no descanso.
A tendência natural da alma
humana é para oferecer os mesmos sacrifícios de produção própria de Caim. Em
Caim nasceu a religião. E é no espírito da oferenda autojustificada de Caim que
ela é praticada.
É difícil não oferecer nada a
Deus. É muito difícil apenas confiar que o sangue de outro cobriu você. É
loucura para os gregos e intelectuais; é escândalo para os judeus e todos os
religiosos.
Para ser discípulo de Jesus a
pessoa tem que renunciar o “si-mesmo”. Ora, isto significa desistir de si mesmo
como “produção” de algo que comova Deus.
Negar ao “si-mesmo” é abandonar a
presunção da persona.
Negar a si mesmo é o que se tem
que fazer para que o “eu” seja alcançado, e, em seu estado mais verdadeiro,
possa ser atingido pelo amor de Deus.
Negar a si mesmo é deixar toda
justiça própria e descansar na justiça de Deus, que, antes de tudo, é justiça
justificadora.
Negar a si mesmo é abandonar a
presunção de agradar a Deus pela imagem e pelas produções próprias.
Quem quer negar a si mesmo?
Se alguém quiser, então tome a
sua cruz. Cruz? Que cruz? Ora, a única. A minha cruz será sempre me gloriar na
Cruz.
Alguém diz: Mas não sobrou nenhum
sacrifício para mim?
O sacrifício é aceitar que o
Sacrifício foi feito e consumado.
Alguém pensa que isto é fácil?
Tente!
Sim, tente apenas e tão-somente
confiar que está pago e feito.
Tente crer que Jesus é
suficiente, não como chefe de religião, mas como o Cordeiro que tira o pecado
do mundo todo.
Tente rejeitar todo pensamento de
autojustificação toda vez que você se vir tentado a se explicar para Deus e
para os homens.
Tente apenas confiar na única
Cruz, e, assim, levar a sua cruz, que é andar pela fé, nunca tendo justiça
própria senão a que vem de Deus.
Tente, e você verá como todos os
seus sentidos se revoltarão, e como todos os seus instintos se eriçarão, e você
se sentirá inseguro, como se a Lei do Reino fosse a da Sobrevivência dos mais
Aptos.
Sim, porque nos sentimos seguros
no sacrifício de Caim, embora ele nada realize diante de Deus. E nos sentimos
muito inseguros na hora de praticar na vida o sacrifício de Abel.
Jesus disse “Está Consumado”. E a
nossa alma, em si mesma, pergunta: “O que mais eu devo fazer?”
Jesus terá que repetir Seu
sacrifício todos os dias outra vez? Ou terei eu de oferecer alguma coisa a
mais?
Ora, se a pessoa consegue
desistir do “si-mesmo”, e tomar a sua cruz, então, Jesus diz que esse tal vai
poder segui-Lo.
“Segue-me” — é o convite.
E aí? O que acontece? Fica tudo
resolvido?
É claro! Está tudo resolvido! Eu,
agora, é que preciso aprender a usufruir o que já está consumado. Assim, tendo
já tudo consumado em meu favor, caminho para experimentar o que já está feito e
pronto.
E como é esse caminho? Como se
faz para seguir Jesus?
Ora, ande após Ele como Pedro...
e os outros.
O discípulo é um ser em
disciplina. Disciplina é o que o discípulo vai aprender.
Que disciplina? A dos centuriões?
É claro que não. A disciplina que
o discípulo vai aprender é amor.
Assim, no caminho, o discípulo
cai, levanta, chora, questiona, se oferece para o que não deve, ambiciona ser
maior, menor, mais amado, mais crido, mais usado, mais devotado, mais, mais...
e, então, vai aprender enquanto cai, enquanto erra, enquanto sugere
equivocadamente, enquanto acerta, enquanto nega, enquanto corta orelhas,
enquanto quer fazer fogo cair do céu e enquanto pensa que sabe, sem nada saber.
O caminho do discípulo é igual ao
caminho dos discípulos no Evangelho, e acontece do mesmo modo. E só será
discipulado se for igualmente acidentado, exposto, aberto, equivocado, humilde,
capaz de aceitar a repreensão do amor e apto a aprender sempre sem jamais
acreditar que se terminou qualquer coisa antes que se ouça: “Vem, servo bom e
fiel; entra no gozo do teu Senhor”.
O caminho do discípulo não está
escrito em manuais e nem em cartilhas de igreja.
O caminho do discípulo é todo o
chão da existência.
O discípulo é forçado a só aprender
se viver. E ele não precisa ter medo da vida, pois é na vida que ele vai seguir
a Vida.
No caminho do discípulo o mar se
encapela, as ondas se levantam e os ventos sopram. Por isso, o discípulo muitas
vezes tem medo, grita, vê coisas, interpreta-as errado — “É um fantasma!”
Seguindo Jesus o discípulo está
sempre seguro, mesmo quando pede o que não deve, e mesmo quando muitas vezes
deseja o que lhe faz mal.
No caminho ele vê demônios saírem
e não saírem; julga e é julgado e aprende que não pode julgar; afoga-se, é
erguido e caminha sobra as águas; vê maravilhas; encara horrores... Mas adiante
dele está Jesus!
Para ser um discípulo de Jesus a
pessoa tem que ficar sabendo que o Evangelho não são quatro livros acerca do
que aconteceu entre Jesus e alguns homens e mulheres muito tempo atrás.
Para ser um discípulo de Jesus a
pessoa tem que ficar sabendo que o Evangelho está acontecendo hoje, do mesmo
modo, na vida dela. E precisa saber que as coisas escritas no Evangelho são
apenas para a gente ficar sabendo como é que acontece na nossa própria vida.
O Evangelho só é Evangelho se for
vivido hoje. Não com a pretensão de dizer que seremos como Jesus. Mas pelo
menos com a declaração de que seremos como os discípulos, e que adiante de nós,
de todos nós, está o Senhor.
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